terça-feira, 26 de novembro de 2013

A PREMATURIDADE EXTREMA E EU

"A prematuridade é decorrente de circunstâncias diversas e imprevisíveis, em todos os lugares e classes sociais. Acarreta às famílias e à sociedade em geral um custo social e financeiro de difícil mensuração. Exige da estrutura assistencial capacidade técnica e equipamentos nem sempre disponíveis. Afeta diretamente a estrutura familiar alterando as expectativas e anseios que permeiam a perinatalidade. É difícil avaliar os
componentes que influenciam e são influenciados pelo complexo processo do nascimento prematuro." (Prematuridade e fatores de risco Ramos HAC, Cuman RKN, Esc Anna Nery Rev Enferm 2009 abr-jun; 13 (2): 297-304)

A descrição acima, contida em um artigo científico, do que acredito ser um processo, e não só um evento, como muitos acham e determinam, mostra que os efeitos deste fenômeno chamado nascimento prematuro não podem ser nem mesmo mensurados, dada a dificuldade de entendimento da extensão da sua influência sobre a vida das famílias que passam pelo mesmo. Eu, mãe de dois bebês prematuros extremos (diga-se de passagem "extremíssimos") acredito e corroboro a citação acima, até onde a prematuridade de um filho afeta a nossa vida? Dificílimo responder, mas alguns exemplos podem ser dados. Nunca, jamais, ever never seremos as mesmas pessoas, fisicamente, socialmente e psicologicamente, esta mudança não necessariamente é para pior, mas é uma mudança das que podemos chamar de drásticas, mesmo!

Participei de um estudo da PUC-SP que é parte do trabalho para o doutoramento de uma pesquisadora da universidade e quando comecei a responder o questionário enxerguei o quão extensa é a seara de sentimentos, responsabilidades e expectativas que nos envolvem quando temos um filho prematuro. A organização e encadeamento das questões faz com que você repense todo o processo de querer engravidar, a alegria do positivo até o desespero e obscuridade dos tempos de UTI e assim fica claro que, mesmo os fatos anteriores ao parto são vistos, a partir do momento que nasce um filho prematuro, de forma diferente. Ou seja, depois do parto prematuro até fatos anteriores recebem conotações diferentes, tamanha é a extensão da sua influência.

Achei muitíssimo interessante esta pesquisa, porque o que a doutoranda quer mostrar é a força do nascimento prematuro no vínculo afetivo e de cuidados da mãe-bebê e como precisamos de apoio psicológico para vencer o trauma e construir uma relação saudável com os filhos que nascem prematuramente...sem mais delongas segue o link para leitura na íntegra do trabalho, ele reflete bem a minha relação com a prematuridade e com a Helena...

http://www.4estacoes.com/pdf/maternidade_prematura_doutorado.pdf

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

APRENDENDO A DAR ADEUS

Uma das faces nefastas da prematuridade é a perda de muitos, muitos bebês prematuros, principalmente entre os extremos (nascidos antes de 31 semanas de gestação e com menos de 1 Kg)...e eu não fugi a estas estatísticas...mas é sempre bom e saudável manter esperanças enquanto é possível esperar, e este post é dedicado às mães prematuras que, como eu, perderam um de seus filhos, ou seu filho, ou ainda estão com seus bebês na Uti Neo e mantém a esperança...mantenham, vale a pena, mesmo que seja para depois recordar. Divido aqui a minha experiência de perda com o relato das últimas 24 horas do Jorge, das quais passei 20 horas ao seu lado.

Acho que quero colocar esta história aqui para que os detalhes não se apaguem, não fiquem nebulosos, não se tornem somente mais uma história da minha vida, esta é uma DAS histórias mais importantes da minha vida, pois nestas 20 horas aprendi muito, acredito que envelheci, no mínimo, 20 anos em 20 horas e neste processo amealhei pelo menos um pouco de sabedoria. Este post não é dramático, a minha intenção é que seja mais informativo, do tipo, isto pode acontecer com você que está lendo e como aprender com o outro é um exercício de sapiência quis compartilhar.

Jorge foi vítima de uma série de erros médicos, como já comentei em vários de outros posts e estes erros o levaram a um estado de "choque" que durou aproximadamente 10 dias. Neste intervalo de tempo ele passou por duas cirurgias (uma de persistência do canal arterial e outra de colocação de dreno em um dos pulmões), momentos estes críticos para a sua sobrevivência. Estes 10 dias foram intensos e cheios de expectativas e esperanças, parecíamos adormecidos frente aos boletins e notícias médicas que indicavam que o pior aconteceria, acho que é a reação de defesa contra algo que não queremos nem mesmo pensar à respeito, mas no fim pensamos a todo momento.

Mas, sem entrar na intercorrências médicas o que fiz nas últimas 20 horas que passei ao lado do Jorge foi segurar sua mão, isto mesmo, passei 1 turno de 10 horas e dois de 8 horas simplesmente segurando a mãozinha dele. Eu, dentro do meu coração, sabia que ele estava partindo, tinha certeza absoluta que o enterraria no outro dia, mas nestas últimas horas não derramei uma só lágrima, simplesmente segurei sua mão e em pensamento repeti a ele milhares de vezes que o amava infinitamente e que eu estava ali, sempre, sempre estaria, não importava onde ele estivesse, teríamos aquele lugar que só nós dois conhecíamos, onde nos encontraríamos para sempre, onde eu sempre estaria, sempre.

Este lugar, construído nestas horas, está mais sólido que nunca, e ele está lá, saudável e risonho, com a certeza absoluta de que a mãe dele não o abandonou, eu estou lá, junto com ele, o amando profundamente e para sempre...então, se seu filho vai partir, não se despeça dele, construa um lugar onde vocês sempre se encontrarão, o seu amor é o suficiente, pode acreditar.

Pois bem, depois que o Jorge se foi eu sempre escuto a música "Somewhere Only We Know" interpretada por vários cantores, ela se encaixa perfeitamente no nosso lugar e quando estava escrevendo este post uma aluna postou no facebook a interpretação da Lily Allen e me apaixonei...como vocês podem conferir abaixo:

http://www.kboing.com.br/lily-allen/1-1276455/

muito lindo mesmo...Eis nosso lugar Jorge, te amo.

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

ESTRATÉGIAS DE VIDA

Então que este post estava em hibernação a tempos, mas sabe quando você não sabe se escreve ou não...aí resolvi escrever para que, se Deus quiser, daqui um tempo eu possa lê-lo pensando diferente e me lembre deste tempo de uma outra maneira. Este semestre orientei um trabalho final de curso muito interessante, tema e orientada, não havia ministrado aulas diretamente para esta aluna durante o curso, mas nossas afinidades foram muitas e o título do post tem a ver com este trabalho.

Sem entrar em maiores detalhes estudamos comunidades que se fixaram na transamazônica e alguns relatos coletados pela aluna e presentes em outros trabalhos sobre a região me abriram os olhos para as nossas decisões e caminhos que são nada mais do que parte da nossa estratégia de vida. Neste trabalho vi diretamente nestes relatos que as pessoas possuem estratégias de sobrevivência e estratégias de vida e estas últimas só existem se as primeiras não tomarem todo o seu tempo e toda a sua energia, ou seja, as primeiras (de sobrevivência) são basilares e necessárias e as "de vida" são demandas, criadas e alimentadas pelo acreditamos ser o melhor para nossas vidas, como um projeção do futuro, dos anseios, das vontades...e esse preâmbulo todo para quê? 

Para começar de novo com a Helena traçando estratégias de vida e não só as de sobrevivência, para não me sentir frustrada a cada crise convulsiva, a cada comportamento diferente, a cada retrocesso e dificuldade...afinal todas estas questões existem para outras mães, não é mesmo? Quero tratar das estratégias de vida, ligadas à escola, à independência e às inúmeras possibilidades de se viver bem sem andar ou comer...quero aceitar de verdade os olhares e as perguntas sobre o porque dela não andar ou não comer pela boca e mostrar que o andador, o tutor e a sonda são apenas estratégias de sobrevivência...as estratégias de vida são maiores...bem maiores e melhores...são imensos vôos a serem alçados e que alcançarão longas distâncias...

Pois bem...neste mês dedicado à prematuridade coloco toda a minha energia nas estratégias de vida que traço para a Helena...no que darão, não sei e nem me importa quero mesmo é que a VIDA seja mais do que simples sobrevivência...convite a todas as mães prematuras que como eu sabem o quanto nos importa a sobrevivência no início da vida dos nossos pequenos, acredito que lutamos tanto por ela que nos esquecemos que eles não precisam só sobreviver, nós demos VIDA  a eles e é isso que merecem!!!!